quinta-feira, 31 de julho de 2014

A importância de um sofá na vida das pessoas



Quando chego a casa, depois de um dia de trabalho e muita canseira, tiro sempre alguns minutos para descansar e aconchegar o estômago com alguma coisa. Em vez de me sentar à mesa na cozinha, cujas cadeiras são tão duras, que se eu estiver lá muito tempo, acabo por adormecer as nádegas, prefiro ir espojar-me no sofá. Assim, depois de sentar o fofinho no canto direito do sofá (tem de ser obrigatoriamente este lado para eu pousar os comandos e ir zappiando pelos canais fora até encontrar um que me agrade), tiro o calçado, levanto as pernas com coragem, dobro-as e ponho-as em cima do sofá, numa posição, que eu diria sexi para ver tv com estilo. Imagino que quem está a ler isto, deve ter voltado atrás diversas vezes e leu outras tantas até perceber que posição é esta! Entretanto, consolo-me com o repasto da tarde: uma caneca de café com leite e um pão com qualquer coisa, ou com tudo o que encontrei de bom e não consegui decidir o que escolher.
 
Estou eu sossegadinha a tirar a minha folga, antes de me enfiar na cozinha e inventar o jantar, quando começa a aparecer a animalada toda cá de casa. Uma das gatas acha que tem lugar vitalício em cima da minha coxa esquerda. Com o seu ar felino, vem de mansinho, aproxima-se do sofá, ganha balanço e sem eu conseguir pestanejar, ela já está em cima de mim! Os outros gatos, estavam a dormir profundamente  noutra divisão qualquer da casa, mas dando conta que alguém está no sofá, eles aparecem e procuram um lugar confortável para continuarem o sono de beleza. Depois aparecem os caninos. Eles sabem que o macho-mor cá de casa só chega mais tarde. De mansinho, vem primeiro um, depois o outro e sentam-se...ao pé do sofá, claro está!
 
Entretanto, começa-se a apoderar-se de mim um sono terrível, que ninguém humano consegue vencer. Aí, sem forças e completamente derrotada, começo a deslizar pelo sofá abaixo, deixando a pose de mulher fatal, ajeito a almofada, empurro com cuidado os gatos para o lado, caso contrário posso experimentar umas unhas á francesa cravarem o meu corpinho, a gata em cima da coxa vai-se equilibrando para não cair. Eu sucumbo ao cansaço e começo a tirar uma pestana à força toda. Tenho de me despachar, não há tempo para inventar e estar com rodeios,  a hora da janta aproxima-se rapidamente. Quando dou por ela (acho eu, uns segundos mais tarde) reparo que o som da tv está muito alto, ouvi uns roncos esquisitos, sinto um certo liquido descer pelo canto da boca até ao queixo, ....bem, isto é a confirmação que adormeci mesmo!!! Há que disfarçar. Toca a levantar. É hora de enfiar o avental e ir por em pratica o que aprendi nos programas de culinária, tentando, ao mesmo tempo, esquecer a figura triste de há pouco. Ao que uma pessoa chega!!!
 
É melhor mudar de assunto...
 
Não há nada melhor que num dia de chuva, de frio, ou de num dia sem nada para fazer de nos aconchegarmos num sofá, de preferência com uma mantinha e nos enroscarmos de tal forma que só pensamos: "Que bem que sabe estar aqui. Ah, como a vida é boa!!!"
 
Assim, meus amigos, descobrimos a importância de um sofá na vida das pessoas: que com apenas uma coisa tão simples como um sofá, gozamos e saboreamos tão bem a vida!!!! Se o sofá for uma chaiselong, tanto melhor!!!
 
 

terça-feira, 29 de julho de 2014

A arte de comer um jesuíta


Um jesuíta.... hum... gosto muito deste bolo. Há de vários tamanhos, sendo os maiores, chamados de cardeais. O problema está em o comer em público. Isto, porque temos de estar preparados para a javardice que vai acontecer...

Para não corremos  o risco de parecemos nauseabundos à mesa, o melhor é comê-lo em casa. Aí podemos nos lambuzar à vontade, sem nos importar que a mesa, o colo, a roupa, o chão, fiquem cheios de mil e uma migalhas de açúcar. Sim, porque aquela parte de cima, maravilhosa, desfaz-se por completo. Não adianta molhar os lábios; aliás, isso é pior, porque vamos ficar com estalactites de jesuítas pelos beiços fora. Quando chegamos ao meio do jesuíta há uma explosão de sabores e de sensações. Eu, por exemplo, com bolos que levem canela, recuo no tempo, ao meu tempo de cachopinha. Gosto de começar pela parte estaladiça e depois ataco o miolo. Guardo sempre um bocadinho da crosta para o fim, para ficar a ruminar.
 
Quando não resisto e atrevo-me a comer um jesuíta na pastelaria, passo o tempo todo a limpar as migalhas da mesa, de mim. Confesso que a melhor maneira é pegar num guardanapo e ir limpando a mesa e deitar os restos mortais do pastel na prato, mas, às vezes, vai mesmo à badalhoca e deito para o chão....ups! O pior é tentar esconder o prazer que sinto em comer o dito cujo....
 
Há bolos que eu evito comer em público: os jesuítas e o mil folhas. O mil folhas não deve ser confundido com o Napoleão. Isso não se deve fazer. É errado, digam o que disserem.


Jesuíta

 
Mil folhas
 

 

 
O mil folhas também tem de ser comido em casa. Começo pela massa folhada de cima e depois belisco a parte das claras e vou tirando pequenos pedaços. Claro que fico sempre com a roupa cheia de açúcar e, por isso, quando estou em casa, vou buscar o avental. Os dedos ficam completamente peganhentos e nada de os limpar ao guardanapo: é lamber mesmo.  No final, como a camada de baixo da massa folhada. Na pastelaria, o bolo vem num prato com talheres... ui, comer este bolo de faca e garfo???? Nã.....
 
As bolas de berlim devem ser comidas em casa ou na praia. Eu, como sou obesa, não as posso comer na pastelaria: "olha para aquela zubaida a comer a bola cheia de creme!!!!". O mesmo não se passa com as magras. Quando estas comem uma bola em público, as pessoas dizem: "sortuda".
 Na praia, não me importo. Como tenho lata de fazer praia de biquíni (não me envergonho de mostrar o pedaço) também não me importo de comer uma bola. Mas atenção: eu faço algo que pode ferir algumas suscetibilidades: eu tiro parte do creme. Ah, pois é. Não consigo comer aquele creme todo. Gosto de o tirar com uma colher; na falta de uma, uso o dedo mesmo. E deito fora. Mas lambo o dedo. Mas não compro bolas sem creme. Que porcaria!!!
 
Eu também como as natas, ou pastéis de nata, de forma diferente das outras pessoas. Manias. Mas como sempre o creme com a colher de café e no fim a crosta. Esta tarefa revela alguma cautela, porque, às vezes, a massa folhada tem folhas a mais e fica cá uma sujeira!!!! E muito importante, crucial até para a continuidade da existência humana: eu abomino natas quentes.... para mim, uma nata, tem de estar fria.
 
 Para terminar, gostaria de vos informar do lugar onde se comem os melhores jesuítas do mundo, quiçá do universo: café Volga, na Rua Costa Cabral, no Porto.
 
Bem, agora o que me apetecia era comer mesmo um jesuíta. Mas com arte: em casa!!!!
 
 
Fica aqui um pouco de história, que um bocadinho de cultura não faz mal a ninguém!!!

"Apesar de afamado em todo o País, é em Santo Tirso que o Jesuíta continua a ser genuíno.
Foi neste concelho que ele primeiro se tornou conhecido, mas quase nada se sabe sobre a sua origem a não ser que a receita foi como que rapinada a um espanhol. A família Moura tem sido ao longo do século um dos bastiões do culto desta tradição, que a fez sobreviver à Grande Guerra, modernizou o processo de fabrico, mas soube manter o paladar e qualidade originais.
A introdução do jesuíta em Santo Tirso deverá ter acontecido por altura do virar do século muito provavelmente durante a primeira década deste quando o avô mandou o pai de Antonieta, então com 14 anos, para o Porto aprender a confeccionar pasteis. Ora o meu avó, vendo-se sem o meu pai, precisava de quem o ajudasse e acabou por vir para aqui um espanhol que começou a confeccionar os jesuítas . Acontece que o estrangeiro era muito cioso dos seus segredos, de modo que nunca revelou ao avô de Antonieta como o pastel era feito. Mas, pelos vistos, também nunca chegou a ser preciso. É que o meu avô lá ia deitando o olho e acabaria por aprender como se faz » .Ou seja, graças a um pasteleiro com olho para a receita, Santo Tirso pode gabar-se hoje, e desde há muito, de ser a origem portuguesa deste pastel apreciado em todo o País.
E quanto à proveniência da receita a ignorância permanece, quanto à justificação do nome do pastel também não se sabe muito. Aliás, como as muitas coisas acontece, as duas coisas andam associadas. Ainda assim, há sempre a tendência para cultivarmos uma hipótese explicativa que tenha alguma lógica: Talvez o formato do bolo seja uma imitação do hábito dos jesuítas, ou se calhar a receita saiu de algum convento, não sei...
Ingredientes: Para a massa: 300g de farinha; 250g de manteiga; 1 a 1,5dl de água; sal Para o recheio: 2 claras; 6 colheres de sopa de açúcar; canela em pó.
Preparação: Prepara-se a massa folhada com os ingredientes indicados e estende-se em tiras com cerca de 4mm de espessura. Batem-se muito bem as gemas com o açúcar, Barram-se as tiras de massa com este preparado e dobram-se. Com uma faca muito afiada cortam-se as tiras em triângulos. Batem-se as claras em espuma e nesta altura começa a juntar-se o açúcar continuando sempre a bater-se até se obter um merengue pouco espesso. Adiciona-se um pouco de canela em pó só para tornar o merengue castanho-claro. Barra-se a parte superior dos jesuítas com este merengue e levam-se a cozer em forno quente, mas sem exagero.
Diz-se que o sabor dos jesuítas, se a água for calcária, não será o característico dos jesuítas de Santo Tirso."
("Artefactos. Os Artesãos e o Artesanato em Santo Tirso; MODESTO, Maria de Lourdes In "Cozinha Tradicional Portuguesa", Verbo, pág. 41)